Dança como resistência a um presente frágil
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Dança como resistência a um presente frágil
Hugo Calhim Cristóvão é coreógrafo, encenador, docente e investigador em Artes Performativas e Filosofia. Tem um olhar atento e profundo, correspondendo à ideia que temos de um filósofo, isto é, o seu olhar distante e presente, confessa a sua introspeção sobre o comportamento humano.
Joana von Mayer Trindade é coreógrafa, performer e professora. Licenciada em Psicologia (comportamento desviante), é uma artista que se destaca pela doçura e pelo sorriso aberto. É fácil reconhecer a sua paixão pela dança, e está explícito no seu olhar que acredita que a dança é para todos uma forma de resistência e de expressão, não só necessária, mas catártica.
Juntos criaram a NUISIS ZOBOP – Associação Cultural de Criação, Investigação e Formação no domínio das Artes Performativas, sediada no Porto, com o objetivo de consolidar novos processos de trabalho do performer, novos modos de estar e agir.
Recentemente, deslocaram-se da cidade invicta até ao Funchal para trabalhar durante uma semana com a Companhia Dançando com a Diferença. O Workshop Dança e Filosofia: Ética, Raízes e Horizontes do Presente Frágil foi o desafio que lançaram aos intérpretes.
Hugo Calhim Cristóvão, com o seu olhar filosófico, conta-nos que a proposta deste trabalho passou por explorar a “fragilidade e a resiliência” na dança, numa altura em que o mundo nos apresenta “impermanência, guerras e homicídios”.
“Pareceu-nos um tema importante a tratar em dança. Como é que se torna o mundo mais fluido e como é que, através da dança, se atinge essa mensagem de resiliência e de poema contínuo (referência a Herberto Helder) de não desistência.”
Nesse sentido, ao longo deste workshop foi trabalhado o “elemento água”, que “penetra todos os espaços, que pode fluir ou derrubar obstáculos”, realça Hugo Calhim Cristóvão, que abordou ainda a “disponibilidade especial para o contacto” que encontrou nos intérpretes da Companhia Dançando com a Diferença.
“Há um motivo para dançar que é independente do facto de ser um trabalho ou de ser uma companhia profissional. Há qualquer coisa que os motiva a dançar, que tem a ver exatamente com a própria vida, com o dia-a-dia”, acrescenta Hugo Calhim Cristóvão, ideia que Joana von Mayer Trindade corrobora.
“É quase como se as palavras não fossem suficientes. A dança substitui as palavras de uma forma muito natural, simples e pura. Isso é muito raro de encontrar. Os bailarinos trabalham muitos anos para conseguir este estado de vulnerabilidade, de pureza, que os intérpretes aqui têm à partida.”
Durante a semana de trabalho exaustiva, os fundadores da NUISIS ZOBOP falam em conjunto de um “caminho de descoberta” que fizeram com os intérpretes da Companhia Dançando com a Diferença.
“A ausência de rigidez, máscaras ou defesas nos intérpretes é profundamente inspiradora para profissionais da dança”, sublinha, com brilho no olhar, Joana von Mayer Trindade.
Hugo Calhim Cristóvão acrescentou que, na Companhia Dançando com a Diferença, encontrou “uma sensibilidade rara e refinada na exploração do corpo”.